Quando o assunto é regularização de imóveis podemos nos deparar com várias situações. Uma delas é quando um determinado imóvel não possui acesso direto a logradouro público, ocasião em que se diz que o imóvel é encravado.
Isso pode se dar por muitos motivos, em casos naturais ou até mesmo um único imóvel ter sido deixado por herança a dois herdeiros e quando do desmembramento um tenha ficado sem acesso à via pública. O que mais importa, nesse caso, é saber quais as consequências de se ter um imóvel encravado.
Bom, primeiro é importante destacar que o imóvel urbano deve ter saída para a via pública, seja rua, avenida, servidão etc. Tal questão decorre da Lei 6.015/73, art. 176, § 1º, II, 3, b, a saber:
Art. 176 - O Livro nº 2 - Registro Geral - será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3.
§ 1º A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas:
II - são requisitos da matrícula:
3) a identificação do imóvel, que será feita com indicação:
b - se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver. (6.015/73, 2020, WEB)
Pela leitura desses dispositivos pode-se entender que o imóvel urbano deve ter acesso à via pública, visto que a inserção do logradouro do imóvel é requisito que deve constar na matrícula do imóvel, no Registro Imobiliário.
Ressalta-se que para o imóvel rural não é obrigatório constar o nome do logradouro do imóvel, razão pela qual é possível que imóveis rurais sejam encravados, não havendo impedimento, em um primeiro momento, para abrir matrícula nessa situação.
Continuando, e as consequências de se ter um imóvel encravado?
Então, se você tem um imóvel assim, para ter acesso à via pública será necessário pedir para os vizinhos acesso pelo imóvel deles. Na prática, isso se torna uma situação desconfortável, considerando que nem sempre os vizinhos possuem boa convivência.
Além disso, ter um imóvel encravado desvaloriza seu valor de mercado. Imagina se alguém gostaria de comprar um imóvel assim e ainda depender da boa vontade dos vizinhos para acessar o imóvel? As chances de alguém adquirir um imóvel assim seriam mínimas.
Aqui na cidade de Joinville a Lei Complementar 389/13 (que dispõe sobre o IPTU e sobre a avaliação de terrenos) prevê que o encravamento é um fator de depreciação do imóvel, e mais, enseja na sua desvalorização. Na prática, um terreno encravado possui valor de mercado inferior se comparado a imóvel com acesso à via pública. Ou seja, muito pouco provável que o dono desse tipo de imóvel consiga compradores caso queira vendê-lo.
Importante salientar que o fato de o imóvel ser encravado não dispensa a cobrança de IPTU, conforme já constou em decisão judicial do nosso Tribunal:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. - REJEIÇÃO NA ORIGEM. IMÓVEL. LOCALIZAÇÃO. DISTRITO INDUSTRIAL. MELHORAMENTOS. EXISTÊNCIA. ÁREA URBANA. INCIDÊNCIA. ART. 32, § 2º, CTN. ENCRAVAMENTO. IRRELEVÂNCIA. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA. NÃO ACOLHIMENTO. - Não há se falar em inexigibilidade do IPTU referente a imóvel localizado em área urbana (art. 32, § 2º, do CTN), porque o fato de estar encravado e nele não ter construção não afasta a caracterização do fato gerador, vez que eventual limitação ao seu uso não desnatura a propriedade do imóvel situado em área urbana e com melhoramentos. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4004702-77.2020.8.24.0000, da Capital, rel. Henry Petry Junior, Segunda Câmara de Direito Público, j. 18-08-2020). (grifo nosso)
Tá, mas como resolver esse problema? Eis algumas saídas, e vamos ver uma por uma:
1º: Passagem forçada: Aqui o proprietário do imóvel encravado poderá obrigar o vizinho que tiver melhor acesso à via pública a fornecer uma passagem do imóvel dele. Se dá mediante decisão judicial e pagamento de indenização.
2º: Servidão de passagem: Se trata de um direito real e geralmente se aplica quando for cômodo às partes, ou quando for de forma consensual. Também envolve pagamento de indenização ao vizinho que fornece uma parte do seu imóvel ao encravado.
3º: Unificação de áreas: Também poderá ser utilizada para regularizar o imóvel encravado. Basta que o proprietário desse imóvel venda ele ao vizinho e este, sendo titular dos dois imóveis, poderá unificá-los, ou seja, dois imóveis se tornam um. Da mesma forma, o vizinho poderá vender seu imóvel ao proprietário do imóvel encravado e assim realizar a unificação.
Importante frisar que a passagem forçada poderá ser utilizada também quando o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado, ou seja, não se exige que o encravamento seja absoluto, conforme Enunciado 88 da 1ª Jornada de Direito Civil, a saber:
O direito de passagem forçada, previsto no art. 1.285 do CC, também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado, consideradas, inclusive, as necessidades de exploração econômica. (CJF, 2020, WEB)
Há decisão judicial nesse sentido também:
AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO. IMÓVEIS LINDEIROS. PASSAGEM FORÇADA. ENCRAVAMENTO ABSOLUTO. DESNECESSIDADE. POSSIBILIDADE DE SE RECONHECER A PASSAGEM FORÇADA EM CASOS QUE O ACESSO À VIA PÚBLICA SEJA INSUFICIENTE OU INADEQUADO. INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 1.285 DO CC CONFORME À CONSTITUIÇÃO. PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. PRECEDENTES DOUTRINÁRIOS E JURISPRUDENCIAIS. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4002205-95.2017.8.24.0000, da Capital, rel. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 28-08-2018). (grifo nosso)
Viu-se neste artigo o conceito de imóvel encravado, as consequências de ter um imóvel nessa situação, além da exposição de possíveis atos que podem ser realizados, de forma a regularizar este tipo de imóvel.
Espero que você tenha gostado desse artigo e esteja mais informado a respeito do assunto.
Você vai me ajudar muito se deixar sua curtida aqui.
Grande abraço!
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